De Pindaré para o mundo! Jovem nascido na cidade embarca para Europa em busca do seu sonho

De Pindaré para o mundo! Jovem nascido na cidade embarca para Europa em busca do seu sonho

Da Folha de São Paulo

Aos 11 anos, ele ganhou a primeira sapatilha. Morador da periferia de Ribeirão Preto (interior de SP), Tallisson Nascimento começou a frequentar as aulas de balé em um projeto social. Seis anos depois, foi selecionado para o Prix de Lausanne, na Suíça, uma das competições mais importantes do mundo, voltada para jovens bailarinos.

Thallyson
O pindareense Tallisson Nascimento se destaca como bailarino

A história do garoto de 17 anos parece filme. Ainda mais pelos próximos capítulos: de 1º a 8 de fevereiro, o filho de uma ex-empregada doméstica que hoje é auxiliar de cozinha em umrestaurante embarca para a Europa para disputar com 70 bailarinos de 15 a 19 anos de todo o mundo um lugar sob os holofotes entre as mais conceituadas companhias de dança.

Um enredo no estilo “a vida imita a arte”. Tallison encarna nos trópicos uma trajetória de superação como a de “Billy Elliot” (2000), de Stephen Daldry. No cinema, um adolescente inglês, filho de um carvoeiro, vence preconceitos e dificuldades para se tornar um bailarino do Royal Ballet de Londres.

“Adoro esse filme. Tem a ver com a minha história e espero aproveitar essa oportunidade e virar um bailarino profissional”, diz Tallisson.

 Marcelo Ferreira, 16 (esq) e Tallisson Nascimento, 17 (dir)
Marcelo Ferreira, 16 (esq) e Tallisson Nascimento, 17 (dir)

Filho de PM, Marcelo Ferreira, 16 (dir), e Tallisson Nascimento, de 17 anos, filho de uma ex-doméstica, nascido em Pindaré-Mirim (MA), ele veio para São Paulo com um ano de idade, quando a mãe decidiu fugir da miséria. É o terceiro dos quatro filhos de Ana Cristina Nascimento, 44, que os cria sozinha. “Tallison ganhou esse dom de Deus. Ele nunca me deu trabalho e sempre foi atrás desse sonho de ser bailarino”, diz a mãe.

O temor materno era não poder custear os passos do filho na dança. “Ganho R$ 1.000, não tenho como ajudar com sapatilhas e viagens.” O suporte para o filho se manter veio com uma bolsa do projeto Fazendo Arte na Ponta dos Pés, dirigido pela coreógrafa Adriana Assaf.

A também diretora da Companhia Paulista de Dança identificou o talento de Tallisson em um curso de férias em 2013, promovido na escola de balé que leva o seu nome, no Tatuapé, na zona leste de São Paulo.

Adriana reserva um número de vagas para alunos carentes. “Ele me encantou logo na primeira audição.”

Além de uma flexibilidade extraordinária, a professora também percebeu que o pupilo chegava à escola sem se alimentar e não tinha forças para aguentar os treinos puxados. O custo de deslocamento era outro obstáculo.

Tallison ganhou bolsa integral e passou a ter ajuda de custo de R$ 100 e moradia –divide uma casa com outros dez bailarinos do projeto. Apesar de ter aprovação para captar recursos pela Lei Rouanet, o Fazendo Arte na Ponta dos Pés nunca conseguiu patrocinadores. “Bancamos o projeto com os nossos esforços”, diz Adriana.

Tallison agrega os seus para tentar driblar um destino modesto na disputada “peneira” na Europa. “Vai ser minha primeira viagem de avião, e logo para o exterior.”

CUSTO EM DOBRO

Escola, amigos e familiares estão empenhados em ajudar Tallison a chegar à Suíça. Os gastos são estimados em R$ 9.000, já que a organização do prêmio não oferece passagem nem alojamento.

E o custo será em dobro, já que a escola foi duplamente contemplada na seletiva de 2015. Filho de um PM, Marcelo Ferreira, 16, foi outro selecionado para o Prix de Lausanne. “Ele também tem muito futuro. Neste ano, foi aprovado para outro concurso em Nova York”, conta Adriana, professora de ambos.

O aluno não teve condições de arcar com a passagem para os EUA no primeiro semestre. “Fiz o passaporte, mas não deu. Agora, espero usá-lo para ir à Suíça”, diz Marcelo. Ele mora com a família em Guarulhos e encara duas horas diárias de ônibus e metrô para ensaiar no Tatuapé.

Venceu a desconfiança da família quando os pais o viram no palco pela primeira vez no balé “O Quebra Nozes”. “Eles queriam que eu fosse médico ou advogado, nunca imaginaram que o filho único ia ser bailarino.”

Hoje, conta com a torcida paterna. “O fato de ele ir dançar na Europa é um acontecimento”, diz o cabo Marcelo Francisco Santos. E conta com orgulho que, desta vez, o valor da passagem já está garantido, graças a uma vaquinha. “Falta o resto, mas vamos fazer de tudo para ele concretizar essa conquista.”

O PM fala com naturalidade de a dança ter virado opção de carreira para o filho.

“Chegavam para minha mulher e diziam: Com o pai militar como ele vai ser bailarino?’.” Ele mesmo tem a resposta: “Somos esclarecidos. É normal e gratificante ver seu filho seguir uma profissão na qual se destaca”.

Marcelo e Tallison integraram o elenco de “O Lago dos Cisnes” na apresentação que valeu o prêmio principal, o de melhor grupo, no último Festival de Dança de Joinville. A dupla foi selecionada para Lausanne por vídeo, já que não havia dinheiro para ir à seletiva na Argentina.

Um “vestibular” pelo qual passaram nomes como o cubano Carlos Acosta, hoje primeiro bailarino do Royal Ballet de Londres, que tem como um dos diretores Philip Mosley, dançarino que serviu de inspiração para “Billy Elliot”.

A companhia do Reino Unido –casa de bailarinos lendários como Rudolf Nureyev e que tem hoje no brasileiro Tiago Soares um dos principais nomes– povoa os sonhos de Tallison e Marcelo. Um objetivo que os faz encarar ensaios repetitivos, dificuldades financeiras e sorrisos enviesados quando se apresentam como bailarinos.

“Ainda tem essa coisa de achar que balé é coisa de menina, mas não me importo. O que quero é melhorar a cada dia e poder sobreviver da dança”, diz Tallison, exibindo um sorriso largo, destacado pelo azul do aparelho que cobre os dentes. Marcelo também sorri timidamente ao emendar: “Nossa rotina é pesada, mas amamos dançar”.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/redesocial/2014/12/1567943-brasileiros-sao-selecionados-para-competicao-de-danca-na-suica.shtml

William Junior

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