Francisco Cavalcante, a força do teatro no Vale do Pindaré

Francisco Cavalcante, a força do teatro no Vale do Pindaré

Por Jojoh Fersan

Em entrevista, Francisco Cavalcante relembra o passado e os amigos da jornada

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Um dos principais nomes da dramaturgia do Vale do Pindaré, o ator, autor, diretor, compositor e poeta, com mais de 40 anos de atuação no meio artístico.

Nesta entrevista, o artista relembra fatos interessantes da carreira, os amigos da jornada, as histórias marcantes e aproveita para descrever o panorama da profissão, aos 55 anos de idade

 

 

Francisco Cavalcante nasceu em Arari-MA, veio para Pindaré-Mirim em 1970 e atualmente mora em Alto Alegre do Pindaré onde é diretor do Grupo de Teatro “Nós em Cena” desde 2010. È professor licenciado em Letras pela UFMA. Sua atuação também se dá na música poesia, artesanato e principalmente na cultura popular.

 

Confira a entrevista com o ator/diretor

Qual o seu primeiro contato com o palco?

Em Pindaré, vendo os ensaios do GAAP, com os saudosos Pedro Serra e Cardoso, além de outros talentos  como Cristina e Zezinho Lopes e aquela turma toda. Depois já comecei a fazer teatro na Igreja Matriz de São Pedro e querendo aparecer mesmo, escrevi a minha primeira peça, “Fé em Deus e pé na estrada”. Depois já emendei uma outras e também não me contentei só em escrever os textos, passei então a compor as trilhas sonoras das peças.

 

O que o deslumbrou no teatro?

A possibilidade de fazer as histórias acontecerem. Onde pode acontecer de tudo, bem ali, na frente de todo mundo.

No início como era o palco da vida real, em relação ao teatro?

Naquele período tudo era muito distante. Nosso mundo era outro, sem televisão, que só chegou nos anos 80 e em casa privilegiadas. Somos da geração ouvinte de rádio, leitor de revista, os filmes de bang bang italiano e nada mais. Uma coisa que muito contribuiu pra minha visão a respeito de teatro foi a presença constante de circos na nossa cidade. Ali víamos o que era fazer uma encenação nas comédias exibidas. É claro que a arte do picadeiro do circo não é a mesma coisa dos palcos, mas deu pra ver muita coisa. Além disso, as representações na Igreja foram uma boa escola para muitos.

O lado ator despertou cedo?

Por incrível que possa parecer eu achava melhor assistir aos ensaios. Meu negócio não era tanto atuar. Me chamava mesmo a atenção mesmo, era o conjunto do espetáculo. Enquanto eu estava nos ensaios, me vinham idéias de como poderia ser feito determinada cena, etc. Acompanhava os detalhes de cenário, da iluminação, do figurino, enfim, a montagem do espetáculo. Minha vontade era de montar um espetáculo. A direção era o que me chamava a atenção. Depois de fazer alguns trabalhos na Igreja, entrei no GRUTAAP (bons tempos!) e passei a atuar mais.

Como você fez para conciliar a vida dos palcos com outras atividades? Sempre foi assim?

Como eu trabalho com a área do conhecimento de Artes e de Língua Portuguesa, Literatura, etc., que sempre está lidando com várias linguagens, inclusive a das artes cênicas a gente acaba, sem querer, se envolvendo com a dramaturgia, seja por meio da música, da dança ou mesmo do teatro. Aí, o professor passa a ser diretor, poeta, cantor, compositor, enfim, passa a ser artista, até sem querer.

Qual a força do teatro como multiplicador e formador de opiniões?

O teatro é um espaço onde o preconceito não tem espaço.Todo mundo pode participar. É onde a inibição encontra sua morte, onde as pessoas tímidas que não conseguem nem falar, com pouco tempo estão cantando, falando melhor, se expressando melhor, melhorando seu rendimento em sala de aula, tendo um relacionamento saudável com seus amigos e colegas de sala. Aprendem a se portar como cidadão nos mais diversos locais. Ao meu redor já houve vários casos desses sucessos mas sempre tem um que chama mais a atenção: Foi o caso de uma garota de uns 16 anos que quase não falava na sala, sentava separada dos outros, escrevia e lia muito mal e já repetia de ano pela terceira vez. Com uns seis meses depois que ela estava fazendo teatro, uma das professoras dela me chamou e disse que a menina estava num crescente desenvolvimento na sala de aula, sendo participativa, mais comunicativa e desenvolvendo a oralidade. Um certo dia, eu, visitando a escola pude presenciar a garota fazendo uma apresentação de seminário com microfone e tudo. (microfone é um terror). É claro que essas coisas podem não acontecer com todo mundo mas sempre há mudanças significativas que servirão para a continuidade da vida. Como eu sempre digo a eles que mesmo que eles não se tornem atores, músicos, bailarinos, diretores, etc. tornando-se bons cidadãos, capazes de atuarem na comunidade em que convivem, promovendo, a partir dessas vivências, pequenas transformações, mas terão conteúdo para serem bons profissionais em outras áreas. E se for como artistas, melhor ainda.

Dá pra aproximar o teatro da política de cultura do município?

Dá, mas eu ainda não vi isso acontecer. Quem faz cultura sabe que geralmente a visão que os gestores tem a respeito de cultura é, quando muito, a das danças folclóricas e das comidas típicas. (É só olhar a maioria das feiras culturais nas escolas) e que Carnaval, Festejo Junino e Natal, contempla todo o complexo cultural de um município, quando na verdade muita coisa fica por fazer.

No caso do teatro, me parece pior. Geralmente o problema começa com a concepção de que teatro é uma ingênua brincadeira de “minino”, quer dizer; teatro não é arte. É um bando de crianças, jovens ou adolescentes que “podem se contentar com qualquer coisa. E isso eu tenho enfrentado diariamente quando vou apresentar um projeto de montagem ou de apresentação de um espetáculo. O dilema começa quando o meu interlocutor PENSA que eu estou falando de uma simples diversão. Como defesa ele começa a achar a montagem cara e começa a cortar coisas. Vai cortando, cortando até ficar em torno de uns míseros 10% que ainda vai custar uma eternidade pra receber. Geralmente eu desisto de perder tempo para receber a “valiosa quantia” e vou procurar outras fontes. Perde-se muito tempo e não resolve o problema. Quando os políticos começarem a perceber a força que tem o teatro, até para eles mesmos, vão pensar duas vezes quando receberem uma proposta de exibição de um espetáculo. Apenas como comparativo: Uma banda de forró metalizado (nada contra) vem ao município, ganha hospedagem, alimentação, deslocamento para o local do show, cachê integral, etc. Vai-se embora, não deixa um centavo para o município, salvo em alguns casos que a nota é tributada. Sabe-se que na maioria não é assim. Por outro lado, um grupo de teatro ou uma companhia de dança (portuguesa, Cigana, Indígena) local ou regional, encontra muita dificuldade para se apresentar. A começar pelo cachê. Uma ninharia. Ou se contenta com ele ou não se apresenta. E ainda tem secretário de Cultura que tem a cara de pau de dizer que se quiser se apresentar pode, mas não tem cachê. Quer dizer; os próprios secretários que na maioria são METIDOS A ARTISTAS são os primeiros desvalorizar o trabalho dos companheiros. Será que apoiando e dando a oportunidade justa a um grupo de teatro não seria também importante para a gestão municipal?

Os órgãos ligados às artes são bem representados?

Talvez o nosso problema não esteja nos órgãos representativos mas para nós que atuamos no interior do Estado é bem mais difícil perceber essa atuação. Por isso até hoje defendo que a SECMA deve ter unidades regionais como a EDUCAÇÃO tem. Quem sabe assim, poderíamos perceber melhor essa representatividade.

O que os novos atores buscam no teatro?

Hoje fazer teatro no Maranhão é uma realidade e tanta, pois não faltam atrativos. Volta e meia e o noticiário mostra um evento importante. Os teatros de São Luis sempre tem espetáculos em cartaz  de grupos maranhenses e de outros estados com atores e atrizes consagradas. Além disso tem a Semana Maranhense de Teatro, agora em dezembro acontecerá o I Festival de Cenas Curtas Godovirá e agora em novembro aconteceu o XX FEMATE. Então, espaço para fazer teatro tem. O que está faltando é as prefeituras através das Secretarias de Culturas trazerem essas companhias até o interior e viabilizar a ida de seus grupos até lá. Palavra chave: intercâmbio. É Necessário pois sabemos que São Luis é sempre onde tudo acontece. Mas pode acontecer aqui também. Nós aqui de Alto Alegre do Pindaré sempre estamos nos movendo e atuando pelas cidades da região. Estamos indo bem e não vamos parar. Acredite.

O teatro do Maranhão tem sua importância no mercado nacional, quais os destaques?

Tem acontecido algumas coisas boas como o sucesso da comédia “Pão com ovo” que já rodou as principais praça como Rio de Janeiro e tem também “A carroça é nossa” no circuito Palco Giratório, também rodando o Brasil.

Em termos midiáticos, foi muito importante a participação de Tácito Borralho na novela Velho Chico. Para nós aqui em Alto Alegre, é de grande importância participar do FEMATE – Festival Maranhense de Teatro Estudantil, pois como falei em 2014, na cerimônia de premiação, que se para uns era uma coisa normal ser premiado, para nós, ser contemplado com um troféu, era uma coisa extraordinária, dadas as condições adversas de montagem, deslocamento até São Luis e outros desagrados mais.

Qual a sua mensagem para os admiradores do teatro na região do Vale do Pindaré?

Para todos os admiradores/espectadores/encenadores: Ficar só choramingando, dizendo que ninguém ajuda, e não fazendo nada não resolve. Quem tem vontade não pode parar de fazer, de apreciar, de encenar. Mesmo que se tenha muito trabalho, que se brigue com muita gente, não se pode parar. Parar é o que eles querem que a gente faça. E nós não vamos parar.

Considerações Finais:

Teatro é cultura, é desenvolvimento intelectual, é a ratificação e ampliação de amizades, é o porta-voz das nossas angústias, das nossas alegrias, das nossas tristezas. É o momento em que todos são um só; atores e público. Nesse momento todas as gargalhadas, todas as palmas, todos os agradecimentos, todas as glórias são partilhadas. Sempre foi assim e assim será. Viva o Teatro!

 

William Junior

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